A primeira vez que o nome Mantiqueira me chamou a atenção foi na capa de um disco chamado Mantiqueira do músico Nelson Ayres – tinha a imagem de um ipê amarelo com uma montanha ao fundo; guardei este LP por vários anos. Havia também a Banda Mantiqueira que reunia a nata dos instrumentistas de jazz de São Paulo e, é claro, já tinha me deparado antes com a citação desse nome nas aulas de geografia. Por muito tempo, Mantiqueira, para mim, era apenas um lugar distante e misterioso. Por morar em Curitiba quase junto à Serra do Mar, esta me atraia mais, inclusive tive uma chácara lá e participei como ambientalista de inúmeras atividades para a sua preservação.
O tempo passou e troquei de serra. Eis-me aqui, morando há mais de cinco anos com minha mulher, Elisa Carneiro, neste belíssimo lugar. Foi minha cunhada quem nos incentivou: “Quando se aposentarem venham para cá”. Em princípio, titubeei, pois, queria ficar mais próximo da minha cidade natal, em uma região também bonita – os Campos Gerais. E depois de algumas idas e vindas, sempre nas férias e feriados prolongados, tomamos o gosto pela Amantiquir - a serra que chora - e construímos uma casa de onde se descortina uma paisagem deslumbrante.
Morando na região observo o interesse cada vez maior de pessoas de São Paulo, Vale do Paraíba, Rio de Janeiro e Belo Horizonte em querer “largar tudo e vir morar na serra”. Muitos já fizeram esta transição e a gente está sempre se encontrando com esses novos vizinhos. Alguns moram até 60 km de nós. Existem grupos de WhatsApp e Facebook que discutem temas correlatos, divulgam atividades regionais e marcam reuniões para confraternização. É claro, sempre com a presença de alguns locais. Nesses encontros rola muita prosa, almoços, jantares, boa cachaça, contação de causos, troca de experiências e tocadores de sanfona e viola. Visitas entre os neo-mantiqueirenses são comuns: “venham experimentar o pão crocante que fizemos”, convida o casal Gi e João from Araraquara. “Sábado tem festa de Reis no Condado”, convida outro. De Araraquara também vieram o ilustrador Lucas Lima e sua mulher Lilian - eles até criaram um site chamado altamantiqueira.
Pouco a pouco a região está sendo ocupada por gente de paz: músicos, produtores de orgânicos, professores de yoga, engenheiros, médicos, psicólogos, ex-empresários, especialistas em bem-estar, novos técnicos na produção de queijos, azeite de oliva, café, chocolates, embutidos, cosméticos e cervejas artesanais. Também chegam os especialistas em turismo e gastronomia criando novas pousadas e restaurantes.
Devagar fui conhecendo os costumes e linguajares nativos e a entender e respeitá-los. Como ouço mais do que falo e gosto de fazer perguntas, seus segredos me são revelados devagar, de forma sutil, como o mineiro gosta. Na Mantiqueira estou aprendendo a não ter pressa, trabalho sempre que posso nas lides da fazenda da família com alguns funcionários, como o Zé Garipu e o Valdeli – é uma delícia conviver com eles, pois enquanto trabalhamos, eu, de minha parte, conto piadas e eles, principalmente causos de assombração e as histórias mais picantes, vividas por pessoas “que já morreram”. Um cuidado que devemos ter quando estamos em lugares pequenos é não fazer julgamentos públicos em voz alta, nem falar mal de ninguém, pois todo mundo é parente de todo mundo.
A Mantiqueira de hoje lembra a ocupação “pelos de fora” da região italiana da Toscana e da Provence francesa abertas ao mundo graças a ampla divulgação em livros, reportagens e filmes. No momento a mídia nacional tem sido generosa com os assuntos locais, ora é um queijo ou azeite que mereceu prêmio internacional, ora são matérias sobre suas trilhas e cachoeiras, ora sobre sua refinada gastronomia e ora, é claro, sobre as deliciosas histórias que só os mineiros sabem contar.
Para aqueles que me dizem: daqui uns dez anos quero me aposentar, comprar um terreno lá perto do seu; eu digo, compre já e reserve, porque daqui a dez anos você não irá encontrar mais nada ou
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